sábado, 12 de fevereiro de 2011

Fluidos

Parada em frente ao espelho do banheiro, Ana se olhava, sorriu, pôs o cabelo para trás da orelha, pegou a navalha do irmão e dilacerou os pulsos. Não deu nem um grito, reprimiu toda dor, um pouco em êxtase olhava seus fluidos escorrerem para o chão de ladrilhos, um banheiro grande e iluminado.
No fluxo do sangue foi lembrando em ordem contrária do que a fizera estar ali morrendo, lembrou-se da dor, da angústia e incertezas de toda uma vida, muito curta, uma menina de 20 anos, aparentemente feliz, mas julgava-se sem sorte, ela com as mãos dormentes e zonza sentou-se e encostou na parede, sentada numa possa de sangue riu, pois lembrando das duas outras fezes que suas pernas se sujaram de sangue, a segunda quando pela primeira vez foi penetrada, ela não se lembra bem de como ou quando foi penetrada mas lembra do sangue e do prazer, a outra foi na sua primeira menstruação, lembrou-se da angústia que sentirá, mesmo com os alarmes de sua mãe de que em algum momento ela sangraria pelos ventres, ela não pode se sentir nada mais do que envergonhada e diferente, sentiu-se mulher. Nunca seria mãe ela pensou, não saberia o que é amar como uma mãe, pois sabia que seria o amor mais puro, o amor mais bonito e o mais doloroso, e com isso percebeu que perderia todo sentimento do mundo, e que já não mais sentira em suas mãos, ou em sua alma toda a dor, ódio, tristeza e amor, na verdade sentir por sentir é que lhe importava, transtornada não queria perder tudo que importava, sua capacidade de sentir, sua vida, tentou gritar, mas já não tinha forças, já não tinha vida, sua luz apagou e sem forças desmaiou.
Acordou num quarto de hospital e se sentiu envergonhada e indignada por ter falhado, mas tão grata, tão grata por poder tentar tudo de novo.

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